É difícil expressar com precisão os sentimentos e sensações que passamos em algum momento de nossas vidas. Essa história é uma delas.
Quando fui à Índia, em 2014, visitei vários lugares e templos. Cada lugar tem seu atrativo, os sentimentos transmitidos e lembranças de algum momento marcante.
Tenho uma lembrança em especial. Andarilhavamos por Nova Delhi, estavamos em quatro pessoas e voltavamos de um templo muçulmano. Cansados de tanto andar e com o delay do fuso horário pesando, "contratamos" um Tuc-Tuc elétrico. Foi quando começou a minha viagem.
O Tuc-tuc dando "finas" de pessoas e das paredes, evaporando tinta do "veículo". Consegui perceber os cheiros, movimentos e situações que surgiam das penumbras e do jogo de luzes dos becos. Buzinas se tornaram parte do todo, nos colocando noutro mundo, onde tudo era normal, um só sentido.
Crianças, animais, pessoas e coisas passavam por nós como as imagens de um pequeno filminho feito em caneta esferográfica nas beiradas das folhas de um grande livro tendo suas páginas viradas rapidamente.
Achei, até, que estava quase em estado de consciência alterada. Ou, quem sabe, enjoado.
Em uma das inúmeras "passagens" e finas, o Tuc-Tuc reduziu a velocidade e quase parou. Foi quando vi um senhor, de pé, dentro de sua 'loja', nos olhando. Quase 8 metros de distância nos separava. Ele me olhou e deu um leve sorriso. Correspondi esse sorriso e ele acenou levemente, como se nos conhecêssemos à milhares de anos. O aceno parou em algum lugar no tempo, e sinceramente, é como se me falasse:
- Que bom te rever meu amigo. Até uma próxima vida.
Instantes depois respondi também com um aceno, e em seguida o Tuc-Tuc voltou a sua tresloucada correria pelos becos de Delhi. Para nunca mais ver meu conhecido, nesta vida.
Comentei isso com meu amigo Alfredo, ainda no Tuc-Tuc. Ele disse, que passou por algo semelhante neste mesmo "passeio".
Viu um homem em seu rickshaw (bicicleta que transporta passageiros em uma confortável garupa), e ele desceu para conseguir empurrar seu veículo ocupado por duas senhoras, que não eram magrinhas. Neste instante, cruzaram um olhar sem expressão.
Nosso Tuc-Tuc fez a volta e cruzaram o olhar novamente. Esse senhor, desta vez acenou, como que agradecendo por "me reconhecer", por perceber sua existência e de seu rickshaw.
Esse passeio maluco pelos becos imundos de Delhi, valeu por toda minha viajem. Poderia ir embora pra casa, feliz.
Foi pura magia.
O mundo pulsa nas pessoas, não importa onde estejam. Seja num beco de Delhi, ou num confortável café na Champs Elysees... se houver realmente presença... vale uma vida. Está ou outra.
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